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segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O Direito Individual/Econômico

A sociedade antiga era marcada pela forte imposição do sistema político-religioso nas relações humanas. Com o Direito, não foi diferente.
Dessa forma, as normas jurídicas eram voltadas para o obedecimento das ordens políticas-religiosas, até mesmo se essa ordem ferir algum direito de determinado cidadão. Por exemplo, se o Rei ordenasse que tal pessoa deveria perder o seu direito de vender algo, ou de permanecer no seu território, tal ordem seria obedecida.
Na sociedade moderna, ocorre uma diminuição da força do sistema político e principalmente do religioso, ao mesmo tempo em que as relações econômicas se expandem. E é claro que o Direito acompanha a sociedade nesse aspecto também.
Sendo assim, a extensão dos mercados faz surgir cada vez mais aparatos jurídicos que garantam os direitos individuais. É o fim da insegurança perante a política e a religião e o início do Direito individualista, que protege o indivíduo e que através do contrato assegura a propriedade de determinado direito.

Weber tem razão



Max Weber, em suas brilhantes interpretações da modernidade – e não defesa desta, como argumentam seus críticos – aponta a questão da racionalidade presente nos avanços jurídicos, isto é, destaca o processo de modernização baseado em deduções racionais a respeito dos atos jurídicos.
Indo muito além do que simplesmente criar explicações partindo da crítica de certo modelo econômico, Weber interpreta os acontecimentos partindo de uma análise multifacetada, englobando não só o modelo econômico, mas outros aspectos como cultura e o contexto desses acontecimentos. Desse modo ele busca entender o processo de racionalização do campo jurídico.
Primeiramente ele estabelece padrões de racionalização, dividindo-os, por exemplo, entre formais (calculistas), materiais (valorativos), práticos e teóricos. A partir daí ele passa a ver de que maneira esses padrões são aplicados. No caso do direito, tanto os padrões práticos quanto os teóricos são utilizados buscando atingir uma dinâmica de racionalização que vai do campo material ao formal.
Isso ocorre, pois – como coloca o próprio autor – o Direito deve pensar na maior quantidade de fatos possíveis que deve abarcar a fim de não possibilitar lacunas na lei, deixando a carga valorativa das ações de lado para não interferir na generalidade e imparcialidade de decisões, lembrando sempre das peculiaridades de cada sociedade.
Weber comprova essa racionalidade existente ao expor a questão dos contratos, que, diferentemente da antiguidade, não leva mais em consideração o individuo em si, mas sim o próprio contrato, ressaltando a dicotomia entre individuo x bens. O autor ainda trata do Direito como possibilidade de emancipação  e da personalidade jurídica do Estado, mas isso é assunto de uma próxima discussão.

A necessidade de um Direito sociológico.


           Na obra Economia e Sociedade (volume II), de Max Weber, encontramos uma das análises mais fundamentais para o entendimento a respeito dos processos que foram gerados por meio da globalização dentro das várias esferas do conhecimento. Principalmente, dentro das matérias que estruturam o direito, o que revela a importância desse autor para os operadores do direito. Além dele, muitos outros pensadores como Habermas e Durkheim sentiram o anseio de explicar e analisar as transformações realizadas pelo processo de globalização dentro das matérias legais.
            Tais anseios e as teorias, frutos destes, nos mostram como o tema tratado por todos esses autores permanece atual e mais como é necessário buscar entendê-lo para fomentar nossas próprias respostas às perguntas que nos são dadas cotidianamente. Pois Durkheim, Weber, Habermas, não estão nos falando de coisas passadas e sim de discussões tão atuais que cercam desde a vida do mais miserável dos indivíduos até daqueles que ocupam as cadeiras em nosso Planalto. Que estão a todo o momento sendo postas em cheque por programas como Brasil Urgente e também por canais como a TV Senado. Que estão cravadas tanto no “rap” das favelas como no pop/rock de bandas como Legião Urbana e Engenheiros do Havaí. E que pode ser resumida na transformação econômica e social, a qual proporcionou a alta mecanização do “direito” e também o alto grau de especialização de suas matérias ocasionando uma maior cientificidade para as questões do judiciário; mas que, todavia, permitem o distanciamento dos indivíduos ocasionando também um maior distanciamento das questões éticas o que, muitas vezes, pode levar a aprovação de instâncias que rompem com os conceitos de justiça e consciência coletiva, que viemos reunindo desde os gregos e fora reclamados e exaltados pelos iluministas.
            Portanto, não é prudente ignorarmos os estudos desses autores se queremos pensar e mais do que isto modificar o direito. Pois, embora esses grandes sociólogos e filósofos discordem sobre diversos pontos a respeito dessas modificações todos deixam a ressalva de que se levarmos as matérias legais em um sentido extremamente normativo, poderemos cair em diversos erros como fora no passado os governos totalitários, além de alavancarmos o distanciamento dos indivíduos dentro de nossas sociedades. 

Interdependência?



Há muito tempo o Direito sofre um processo de racionalização que vai da racionalização formal à material de acordo com a teoria weberiana.  Exatamente nesta medida, o processo de racionalização do Direito não está isento de forte carga valorativa e fortemente atrelado a valores e ao modo de organização social ocidental moderno. Fica evidente quando se lança um olhar ao passado, que o Direito serviu em algumas ocasiões como forma de legitimação do poder ou dos valores de determinada cultura e esteve intimamente ligado à economia. Quando ainda colônia, o trafico negreiro possuía o aval jurídico, mas posteriormente, com o desenvolvimento do sistema financeiro e as novas demandas comerciais e econômicas, esta mesma prática sofre pressão para sua extinção. A necessidade econômica de novos mercados (desenvolvidos com trabalho assalariado), bem como a pressão da economia inglesa, podem ser elencados como fatores para a ação do Direito rumo à imposição da lei de proibição do comércio marítimo de escravos. Esse desenvolvimento do processo de racionalização do Direito parece fortemente atrelado ao desenvolvimento de sistemas econômicos ocidentais. Assim, não se pode deixar de questionar o próprio desenvolvimento de uma pauta de Direitos Humanos e sua aplicação enquanto caráter universal, aplicação à outras culturas, de modo a se expandir ao redor do globo. Não cabem aqui questionar os avanços das liberdades conquistadas por uma pauta de Direitos Humanos, ou ainda os direitos de minorias alcançados por uma mesma pauta (indubitável avanço social), mas somente pensar sua aplicação enquanto ferramenta de ampliação do capitalismo e da conquista de mercados consumidores, bem como o crescimento de uma indústria voltada para o consumo que a garantia de direitos de determinadas minorias acarreta. Essa digressão tem por objetivo, não questionar os bens sociais trazidos pelos Direitos Humanos, mas sim repensar a possível separação do Direito da Economia, ou ao menos, a aplicação do Direito para a garantia de um possível welfare state em tempos de austeridade econômica, e não a simples dependência do Direito enquanto ferramenta econômica.

Mecanização do homem


Weber constata em sua obra que as relações humanas nos períodos antigos muito se diferenciavam das, que após o advento do estado liberal, começaram a surgir entre os homens, as relações que antes eram estritamente pessoais, em que a confiança entre as partes era a única garantia de cumprimento, foi substituída após a revolução francesa pela frieza do contrato, pela burocracia que organiza e garante a segurança dos negócios pelo viés jurídico.
A racionalidade extrema a qual o homem tem cada vez mais se aproximado é denominada por Weber de “racionalidade formal”, a racionalidade formal muito se assemelha a um sistema de proporções em que há embutido em tudo uma finalidade, onde o caráter teleológico das ações humanas se torna estritamente utilitarista, onde as ações e tudo mais é calculado a fim de se obter algo.
                O autor afirma que, para a possibilidade de manutenção deste tipo de relação, se torna necessário um sistema jurídico/burocrático que garanta segurança de maneira impessoal, um sistema burocrático extremamente técnico que funcione de maneira mecânica, que não se prenda aos valores impregnados aos negócios jurídicos.
Weber afirma em sua obra que há um processo de negação de tudo aquilo que transcende o humano, que todos os aspectos de extrema mecanização das relações humanas/jurídicas explicitam o processo chamado pelo autor de “desencantamento do mundo”.

Através da análise de Weber, pode-se observar que desde a antiguidade, há preocupação e necessidade de um artifício que concretize determinadas ideias e relações, seria uma forma inicial de contrato. Entretanto essa ideia de contrato difere da definição que temos atualmente: o contrato poderia ser considerado uma forma de confraternização, como por exemplo o contrato de sangue, que carrega em si "elementos mágicos".
O não cumprimento desse contrato não acarretava penalidades e nem a necessidade que se deva zelar a um contrato, como existe hoje.  Tem-se portanto pessoas que se relacionavam por terem algo em comum, por acreditarem em certas ideias e então o contrato surgia como uma forma de demonstrar a confiança, a confraternização.
Mas com o passar do tempo, observa-se a evolução do contrato, que agora trata diversas relações humanas com total formato sistemático, ele existe em todas as relações humanas, é como se fosse o papel necessário a todas relações: ele defende interesses, é prova para punições, é utilizado como arma letal (ESTÁ AQUI NO CONTRATO). A mecanicidade dele   acaba por não levar em conta os aspectos humanos, é assim porque está no contrato, não há como mudar. É ele que relaciona estranhos entre si, que nunca conversaram sobre os gostos, comida, a vida, opinião política e social, não, existe um contrato que relaciona eles, mesmo se possuírem ideias contrárias, os vínculos existentes entre essas pessoas são calculados, frios e definidos por folhas de papel.
E é dessa forma que o contrato, como tentativa infalível do cumprimento de determinados atos, tornou-se de certa forma um “desumanizador” nas relações humanas, pois ao efetuar um contrato, cria-se uma relação de poder entre ambas as partes, sem que elas se pronunciem, se conheçam ,cria-se uma disputa de interesses, o contrato tem por simples e complexa função garantir os direitos dos contratantes.
Há portanto a impessoalidade do direito, que é cada vez mais atenuado na modernidade e  com a racionalização, há a impessoalidade das relações, ou seja, perda da humanidade no próprio ser humano





Do material para o formal

A modernidade caminha em direção à racionalidade, ainda que o homem não seja um burocrata sem desencantamento do mundo, mesmo não sendo isentos do irracional, a racionalidade está presente em maior grau, a própria modernidade faz o direito ser mais racional, a religião é deixada aos poucos pelo conhecimento científico, caminhamos do material para o formal.
Weber subdivide a racionalidade em: racionalidade formal, a qual é obtida através do cálculo, estabelece-se mediante caráter calculável da ação e seus efeitos; racionalidade material, que leva em conta os valores, exigências éticas e políticas; racionalidade teórica é o que a física faz, a explicação a partir de enunciados teóricos; racionalidade prática, a qual não interessa os meios para atingi-la;
A racionalidade pode estar presente até em princípios religiosos, como fazer determinada ação para atingir a salvação, e o protestantismo estabelece-se dentro da lógica moderna, transforma efetivamente o mundo, expressão do processo de racionalização. Existem lógicas dentro da modernidade, não só a lógica do capital, várias formas de racionalidade que determinam um comportamento.

Sociedade tecnicista

    O autor Max Weber, em sua obra "Economia e Sociedade - Fundamentos da Sociologia Compreensiva" estabelece sua própria visão de realidade. Para ele, esta possui uma dinâmica própria, que ostenta múltiplos aspectos de racionalidade: a material, a formal, a teórica e a prática. Weber dá ênfase à esfera do Direito, a qual oscila entre as racionalidades material, que leva em conta os valores e as demandas sociais e políticas da sociedade, e formal, cujo caráter se calcula levando em conta as ações e seus efeitos. 
     Partindo disso, o autor ainda problematiza a configuração atual do Direito, discorrendo sobre a generalização e a sistematização da sociedade, caracteres essenciais, na visão de Weber, à construção de um sistema jurídico sem lacunas. No que concerne à generalização, é um aspecto que não se mostra muito efetivo, pelo contrário, apenas serve para tornar o Direito mais frio e menos abrangente. Constata-se isso quando vemos inúmeras faculdades de Direito formando técnicos jurídicos, que vão se pautar preponderantemente por princípios tecnicamente pré-determinados, perdendo seu caráter pensante, crítico. As decisões e ações que tomarem, formem-se eles como juízes, advogados ou qualquer outro cargo, serão generalizadas e com mínima interpretação, o que é profundamente danoso no campo em que atuam, visto que esse lida com vidas humanas, ou seja, cada caso é muito complexo, são muitos os fatores que nele influem, para serem decididos apenas levando em conta o código propriamente dito.A sistematização, por outro lado, mostra-se indispensável à organização da sociedade, entretanto, devido a essa mesma complexidade, não consegue suprir suas lacunas.
      Porém, na visão de Weber, o Direito deveria ser totalmente impessoal, e o auge dessa impessoalidade seria representado pelos negócios através de contratos, pois as bases jurídicas que para eles são necessários vão bem além dos vínculos pessoais, estabelecendo a relação entre Direito e Economia, uma vez que, através dele, é concretizada a garantia de perduração no tempo de um poder de disposição de algo. Está baseada, assim, a relação mais elementar entre as esferas econômica e política: generalizada e sistematizada, totalmente impessoal, refletindo toda o tecnicismo da sociedade.


Max Weber delimita os traços da sociedade moderna pautando-se na teoria da racionalidade formal, segundo a qual tudo possui um fim utilitarista, as relações interpessoais já não são direcionadas pela emoção, pela frugalidade, pela magia, religião, costumes, moralidade ou pela espontaneidade, mas pela fria racionalização. As conseqüências deverão ser previstas para que as falhas sejam evitadas. Tudo deverá ser calculado para que os lucros sejam os maiores possíveis, lucros em seu sentido literal ou não.
A racionalização formal, no direito, possui como instrumento de máximo valor o contrato, que pode muito bem ilustrar esse aspecto do pensamento weberiano. O contratualismo representa a segurança jurídica tão desejada pela burguesia, que possibilitou a maior aferição de bens e sua acumulação. O contrato tem força de lei que pauta relação entre particulares, que expressa a vontade das partes, qualquer que seja ela, desde que lícita e desde que preenchidos os requisitos legais de forma, de pessoa e de objeto.
A burocracia é extremamente benéfica e necessária no mundo racional em que vivemos, mas não deve ser método exclusivo de resolução de conflitos ou de organização de tarefas. Não devemos nos acomodar com a comodidade que ela oferece. Deve prevalecer a interdisciplinaridade. Os contratos, as leis, os casos concretos não devem ser interpretados apenas metodicamente, mas em consonância com os aspectos sociais, valorativos e humanos. Não se trata de axiomas, mas de instrumentos reguladores da conduta humana e o caráter da essência humana deve ser levado em consideração não apenas em seu aspecto racional, já que o homem não é somente razão.

Sociedade mutável

Na Antiguidade as relações comerciais e a noção de propriedade eram bem diferentes do Estado Moderno. A propriedade era vinculada não apenas ao indivíduo, mas ao grupo social em que ele estava inserido. Terras, por exemplo, na Grécia, era vinculada aos cidadãos da pólis. As relações comerciais se pautavam não apenas na relação individual entre as partes, mas às relações sociais entre elas.
Essa estrutura precisou ser modificada para que chegássemos ao nível de negociações em que nos encontramos hoje. Negociar, no Estado Moderno, é impessoal. Não é importante mais quem vende ou quem compra, apenas se é um bom negócio.
Para essa liberdade de comércio acontecer, toda a estrutura do Direito precisou ser modificada. Era imprescindível que as leis dessem respaldo às negociações, criassem mecanismos que protegessem a propriedade individual de modo a promover essa forma diferente de comércio.
A burocracia criada, por mais que pareça atrasar as negociações, na verdade, serve para dar garantias aos contratantes que os termos serão cumpridos.
Isso gera uma maior liberdade de negociação. O que importa são os bens e não o negociador. Infelizmente, isso também gera a desigualdade. Passa a ter mais liberdade de quem possui mais bens que, com isso, consegue fazer com que os termos do contrato lhe sejam favoráveis.
A análise de Weber tem um papel muito importante pois dá uma diferente visão sobre a evolução da sociedade. Focando nas relações de contrato, ele consegue não só analisar as transformações do Direito, como perceber que hoje, o próprio Direito é causa e efeito dessas modificações.

Para Weber a criação do direito na sociedade moderna, é entendida a partir da racionalização e da racionalidade, sendo que a racionalização não seria apenas o sentido da  ciência e do cálculo, mas sim sob vários aspectos diferentes.
Ou seja, Weber acredita que a modernidade se constrói mediante diferentes dinâmicas de racionalização, que são expressadas por caminhos variados.
Ele distingue quatro tipos de racionalidade, e afirma no campo do Direito a racionalidade vai da área "material" á área "formal". 
A primeira destas seria a 'racionalidade formal' que é caracterizada pelo caráter calculável das ações e os efeitos, que como exemplo no direito teria o fato de se pensar n normatização e nos efeitos desta para quem comete um crime. A segunda seria a 'racionalidade material' que considera valores, ética, costumes e política. A terceira seria a 'racionalidade teórica' que seria o entendimento teórico da realidade, e por fim a 'racionalidade prática' que seria o planejamento metódico para alcançar determinado fim.
Ainda no campo do Direito, Weber discute a ideia de sistematização, que seria o estabelecimento de um sistema de regras com lógica interna bastante consistente, e mais abrangente,de forma que diminua o numero de lacunas nas leis.
Um fato que ele cita que é novo, é a disposição jurídica que garante o direito dos indivíduos, fato que seria imprescindível na ordem moderna.
Ao tratar da relação de Direito e Economia, ele afirma que seria a garantia ao longo do tempo, do poder de disposição de algo. Ou seja, quem tem o poder de fato de disposição de algo, com sua segurança jurídica, ou quem tem algo prometido sob essa mesma segurança, estabelecem relações que são elementares no Direito e na economia.
Assim ao tratar sobre o contrato, ele afirma que este tem por função relações puramente econômicas  e que não leva em conta qualidades universais do status social.


     Max Weber, em sua obra Economia e Sociedade, procura revelar as relações existentes entre o ordenamento jurídico e a economia típica do capitalismo moderno.

     Segundo o autor, o estabelecimento de um sistema jurídico se mostra um pré-requisito, fator imprescindível para o desenvolvimento da economia como hoje a temos. Uma vez estabelecido, vemos o rompimento com características e condições econômicas pré-capitalistas da antiguidade, que freavam o avanço econômico.

     Nesse momento, ocorre a desvinculação da economia com o caráter político-religioso antigo e com intermédio estrito dos vínculos pessoais presente nas transações, essencialmente por meio dessa garantia jurídica que acaba por expandir o horizonte capitalista.

     Dessa forma, vemos surgir a afirmação do poder nas relações de troca, assim como a expansão das relações contratuais privadas, agora livre dos "fatores mágicos". Estas, que consistem num motor do desenvolver econômico, passam agora a usufruir de uma maior liberdade e confiabilidade necessários à sua efetivação.



 Renan Silveira

Racionalização jurídica

     Ao se ler a obra de Weber, pode-se notar uma análise, não apenas do direito, mas da evolução das relações interpessoais, partindo da antiguidade até o contemporâneo. Para ele, o pensamento humano, e por consequência o pensamento jurídico, vem sofrendo um processo de racionalização.
     Com tal evolução, para ele, podemos facilmente distinguir dois tipos de racionalização, uma dita como racionalidade formal, e outra a material. A formal, seria a razão pura, fria e calculada, enquanto a material viria carregada com a moral, a tradição e a opinião . Dito isso, chega-se a conclusão de que a sociedade vem progressivamente se colocando, e legitimando a racionalidade formal. Exemplo prático é se compararmo-nos com os povos da idade média, cheios de crenças e limitações religiosas, que levava a um Direito manipulado e infestado de parcialidade.
     Entretanto, se seguirmos por esse caminho, e com o tempo apenas valorizarmos o formal, como ficará nosso Direito? Onde entrarão os costumes e tradições? Como se aplicará a semelhança de sentença? E o mais notável, como se aplicará o bom senso e percepção crítica de um qualificado juiz?
     É evidente que evoluímos muito, no sentido de uma justiça menos parcial, no sentido de um julgamento mais plural e menos pré-determinado. Entretanto, devemos sempre nos preocupar em diferenciar a imparcialidade da mecanização. É possível um Direito mais digno de ser considerado a balança da sociedade, sem que se torne cego, dando as costas para a conjuntura nacional. Imparcial, claro. Mecânico, jamais.

Se, para Durkheim, o Direito emana do povo e tem uma origem exclusivamente social; para Weber, a modernidade se constrói mediante diferentes dinâmicas de racionalização, expressando-se por caminhos múltiplos. Sendo assim, Weber coloca em questão quatro tipos de dinâmicas de racionalização: a material – que leva em conta valores, exigências éticas, políticas etc -, a formal – que considera aquilo que existe de fato, algo que seja concreto -, a teórica – que considera uma realidade possível, sendo, portanto, algo abstrato – e a prática – que segue uma metodologia para atingir a sua finalidade.

Pensando no Direito, Weber conclui que este está relacionado a mais de uma dinâmica de racionalização e o analisa ao longo da história, relacionando-o com a Economia. Percebemos, então, que na modernidade, com o fortalecimento e estabelecimento do capitalismo como modo de produção, o Direito sofreu modificações e passou a garantir direitos individuais.


Com a ampliação do mercado e aumento das relações comerciais, havia a necessidade da garantia jurídica no campo econômico para que aquilo que fora estabelecido segundo o Direito perdurasse ao longo dos anos com maior importância perante a sociedade. Nesse contexto, percebemos que as relações entre os homens sofreram intensas modificações e passaram a ser mediadas, em grande parte, pelo Direito.

Assim sendo, o Direito fez-se cada vez mais presente nas relações humanas e na vida das pessoas: houve a necessidade do contrato, o aumento de processos burocráticos e o surgimento de direitos individuais.  As relações baseadas na confiança, restritas a pessoas de uma mesma família ou restritas a pessoas que possuíam os mesmos valores, ideologias ou origem étnica tornaram-se cada vez mais raras.

Essa situação é muito clara no mundo atual em que a importância de um negócio econômico se sobrepõe às diferenças de valores e em que um contrato pode ser estabelecido independentemente da diferença ou rivalidade existente entre as partes envolvidas. Como exemplo disso, podemos pensar nos acordos que existiram entre os Estados Unidos e a União Soviética e nos acordos que existem entre países ocidentais e países islâmicos.

Com isso fica evidente a intensa racionalização que o Direito que, muitas vezes, desconsidera o caráter humano que existe nas relações em que intermedeia. E, diante desse processo de racionalização do mundo, fica clara a mudança de valores do homem, que passa a dar mais importância à sua individualidade, a um papel do que à palavra do outro e a um negócio econômico do que à sua religião, ao seu posicionamento político ou aos seus valores culturais.

Da tentativa simples de compreender e dominar
A realidade teórica do mundo
Para uma racionalidade prática a fim de um fim chegar
Após um suor tênue em contas metódicas
Sistematizo o sistemas das regras que me guiam, 
Que traz à pele a lógica interior do ser.
E passando pela "constelação de fatos" na cauda da lógica jurídica
Se faz completo um estado latente, 
Se faz completo um sistema distante
E assim, viajando no tempo, chego a um tempo presente
Onde acordos jurídicos garantem direitos
E trazendo direitos, trazem segurança
Pois, o contrato se expressa como forma racionais das relações
Me levando, assim, a questionar
Quem sou agora, se quem fui já não mais importa
Se de onde vim já não interessa
Se minhas palavras já não dizem nada
Se Irmandade já não diz nada
Se Amizade já não diz mais nada,
Mas um papel velho, rasgado, carimbado, assinado
Diz tudo.



          Guilherme Paim


W que une Economia e Direito


Weber admite várias perspectivas da análise das relações entre Direito e Economia. O autor examina o surgimento de diversas categorias jurídicas, identificando como, afinal, certos predicados do direito e das normas jurídicas se relacionam às características básicas da economia capitalista; em particular, ele trata como e o porquê as características do direito racional se adequam ao requisito da previsibilidade enquanto condição para o cálculo econômico racional.
É destacada, também, a importância do fato de as relações econômicas serem mediadas por formas jurídicas; tanto no que diz respeito à manutenção do poder de apropriação quando sua transferência. A economia capitalista é num sentido forte, uma economia contratual.
Weber problematiza as consequências das normas sobre comportamentos humanos, analisando a capacidade de a ordem jurídica efetivamente motivar as ações do mundo real.  Trata-se de saber se a norma jurídica constitui um motivo para a ação social econômica; em que medida as ações do mundo real se deve à existência de normas jurídicas que as orientam; em que medida a existência de certas normas jurídicas é condição necessária (e/ou suficiente) para as ações reais; e se essas normas criam condutas regulares desejadas pelos tomadores da decisão normativa. São todos questionamentos levantados ao decorrer no livro.
O direito, na visão weberiana, pode ser entendido como uma parte constitutiva das relações econômicas capitalistas. Entre outras implicações, a ideia de que o direito pode ser tanto a causa como o efeito das condutas cíclicas econômicas, pode ser entendida como algo mais do que o reconhecimento de que os processos históricos passados podem exemplificar um ou outro sentido causal. Essa ideia pode ser também entendida como indicador de simultaneidade: o direito é, simultaneamente, causa e efeito da ação social-econômica. É causa porque o processo econômico (no qual há contínua criação de novos tipos de direitos subjetivos) pressupõe um sistema jurídico como condição necessária. É efeito porque essa criação de novos direitos tem efeito cumulativo, que realimenta o grau de sofisticação e complexidade do sistema jurídico.
Objeto de pesquisa no nível interdisciplinar, o efeitos das normas, tomadas não em seu sentido normativo, mas considerando a ordem jurídica em seu processo de atuação, se constitui – ou não – motivo para a ação social econômica.

Desencantamento do Mundo


Weber entenderá a modernidade através do conceito da racionalização. Quanto ao direito não podemos falar somente da racionalização do ponto de vista cientifico, devemos falar da racionalização que tenha como pressuposto uma orientação prática e aquela qual o direito tem como mais intensa, a racionalização formal, que considera as ações e seus efeitos a partir do calculo racional.

A sociedade moderna pode ser chamada de sociedade do contrato. A racionalidade jurídica do contrato substitui toda uma gama de procedimentos “não racionais” (pactos de sangue, juramentos) pela forma jurídica racional, que não está interessada em dimensão outra do indivíduo senão aquela que estabelece o compromisso com o que prescreve o contrato, ou seja, a personalidade jurídica do indivíduo.

As ideias que temos de propriedade mudam, não existindo entraves que não os econômicos para seu acesso. A terra não tem mais perspectiva de produtividade social. Mesmo que permaneça na letra da lei uma ideia de função social da terra, é cumprida através do pagamentos de impostos, entre outros meios. Através dessa mesma “engenharia jurídica” que responde ao cumprimento de função social da terra é que o capitalismo pode prosperar e o mercado se dinamizar.

A doutrina filosófica do liberalismo que sucede ao capitalismo cederá a liberdade jurídica àqueles que detêm o poder econômico, não sendo mais necessário uma condição de sangue, mas apenas a condição econômica. Não existem mais obstáculos à liberdade do contrato, sendo que a modernidade expulsa quaisquer outras formas não econômicas dessa perspectiva.

Thomas Morus


“Palavras, palavras de um futuro bom”
Para Weber, a racionalidade jurídica iria do material para o formal. Isto é, se antes levava em consideração os valores e a ética, agora passa a ser matemática, a calcular as causas e os efeitos.
O melhor legislador seria aquele que, tal qual a deusa Themis, colocaria uma venda em seus olhos e pensaria em um caso abstrato, deixando de lado as particularidades de cada caso, a fim de não cometer injustiças.
Basta um breve olhar sobre nossa lei maior kelseniana para perceber que essa generalização acaba gerando uma utopia, a partir do momento em que se criam normas programáticas e passa-se a utilizar a teoria da reserva do possível. A partir daí percebe-se o grande senso de humor presente em nossa Constituição. Começando logo pelo artigo primeiro, inciso III, lê-se que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana. Contudo, o inciso IV esclarece que a livre iniciativa também é, de onde se pode inferir que a lei maior elege como sistema econômico o capitalismo social – um termo paradoxal. Dando um salto para o artigo terceiro, onde se determinam os objetivos de nosso país, o inciso I afirma que um deles é “construir uma sociedade livre, justa e solidária” – onde se escondeu a igualdade que a tão clamada democracia nos prometeu? Isso nos é esclarecido no inciso III, que cita o objetivo respeitável de “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. Reitera-se: reduzir as desigualdades sociais. O objetivo do legislador – e da classe dominante – nunca foi dar uma vida digna às pessoas e prezar por um dos valores dominantes da democracia: a igualdade. Apenas fazer os ânimos se calarem conformados e seguir a exploração. As anedotas constitucionais seguem, artigo a artigo. São promessas para um futuro e o futuro que nunca chega.
O mais triste é que, quando uma raridade judiciária percebe que essa generalização tem trazido ainda mais desigualdade e resolve aplicar o ativismo judicial, buscando uma real emancipação do povo, a maioria critica, afirmando ser “antidemocrático”. E pior ainda é ouvir essa afirmação de determinados professores de uma renomada universidade pública, que afirmam que, porque alguns entram na justiça para conseguir o remédio de que necessitam para uma vida digna, “daqui a pouco vão entrar na justiça querendo casa também”, vejam só, que ousadia! Não devemos reivindicar nossos direitos constitucionais, eles servem apenas para deixar o direito mais colorido, assim como a denominação do Brasil de “Estado Social de Direito”.
E assim, vai seguindo e se fortalecendo o capitalismo, cada vez mais amparado pelo direito: pelo princípio da reserva do possível, pela afirmação de ser antidemocrático o ativismo judicial, pelo surgimento de contratos, pela Constituição – relação entre direito e economia atestada, inclusive, por Weber. E a exploração, cada vez mais se faz presente e cada vez menos se faz evidente, pelos floreios que o direito faz aos princípios capitalistas.
Perdoem-me os que esperavam ver nesse texto imparcialidade e uma mera tarefa para nota, mas foi um desabafo de alguém que, infelizmente, quanto mais estuda o direito, mais prefere ler Thomas Morus.

Da racionalização ao desencanto


 A racionalização do mundo, ou melhor, de todos os aspectos da vida do homem, das relações sociais, do modo de pensar e de agir, estabeleceu padrões para todas as áreas, atuações, condutas e expectativas de forma generalizada. Não se ignora que ela foi e é necessária, não só para a organização do conhecimento e sua produção, mas também para a regulação da vida em sociedade. A racionalização veio e veio para ficar, tal como Weber ilustra em seu discurso sobre o contrato.
  A análise histórica mostra o caráter atemporal do contrato, isto é do poder que ele determina. Mas para que esse objeto jurídico histórico se consolida, acompanhando a racionalização e se guiando por ela, tudo o que era considerado irracional­ teve de ser “abandonado” - ou ignorado. Essa mudança de postura provocou o choque entre “o novo e o velho”, entre o explicável e o mito, a crença, o irracional, o absurdo, o valor e o explicável...
  A impressão que história passa é que durante certo período o homem demorou a se adaptar a essa nova realidade, fato que há poucos séculos se deu com muito sucesso. Até mesmo a arte, a produção mais subjetiva da alma humana, foi racionalizada e a música, a expressão, as narrativas são produtos efêmeros do mercado. Ocorre que, apesar de a tecnologia e outros avanços dos tempos modernos serem bem aventurados, o desencantamento presente nas pessoas é marcante.
  O desencantamento do mundo, com relação a tudo e a todos, é consequência da alta racionalização supracitada. Poucos ensinam valores morais e éticos que, ironicamente, todos reclamam a falta. Poucos se dedicam o tempo e a responsabilidade necessários para a formação dos indivíduos. Dessas infelizes constatações saltam as explicações das atrocidades que uns cometem com outros ou contra si mesmos...
  Casa-se sem ter o intuito de crescer junto, ou de guiar o crescimento de outros; se é amigo para não ficar sozinho, não havendo o menor interesse em saber quem realmente é o sujeito ou quem são aqueles que também fazem parte da vida dele; tem-se nas figuras familiares provedores perpétuos, no trabalho uma obrigação ou fonte de enriquecimento...
  Essas condutas e tantas outras não estão distante dos indivíduos no dia-a-dia, recolhidas nos filmes, seriados ou novelas; mas estão por toda parte, basta boa vontade e lucidez para enxergá-las. Sim, são dolorosas para muitos, para os desiludidos e desencantados com a vida... o reconforto, porém, pode ser encontrado ainda. Em algumas obras literárias, alguns filmes, alguns depoimentos, em algumas pessoas e produções que se preocupam com conteúdo caro àqueles que se dedicam ao exercício do pensamento livre de amarras e tendências.

A cruel necessidade da racionalização jurídica



                Durante a histórica evolução da racionalidade de nossa sociedade o direito também obteve sua evolução relacionada a esta evolução racional da sociedade. Com o passar dos anos, a racionalidade social exige dos dispositivos legais um maior amparo aos indivíduos e as suas relações, relações estas que são um exemplo da evolução pelo simples acréscimo da palavra “jurídicas”.
                Mas não só para os indivíduos foi necessário um desenvolvimento do direito, mas também para a economia, a base do capitalismo atual, que influência tanto a vida das pessoas. Um simples exemplo que caracteriza a evolução necessária do direito para uma maior segurança para a economia, e sendo a segurança dos negócios jurídicos altamente necessária, são os tratados internacionais de comércio que por serem internacionais respeitam algo ainda maior que o estado, um direito internacional.
                Também junto com e “modernização” do direito que evolui conjuntamente com a racionalidade das sociedades, surge a confusão entre os direitos públicos e privados, já que relações antes firmadas na confiança, no afeto, na ética e na moral, são hoje firmadas através de assinaturas e carimbos, retirando o elemento humano das relações e adicionando a racionalidade, podendo até parecer cruel de certo modo, mas necessário neste mundo pós-moderno, altamente complexo. Um exemplo da necessidade da existência do elemento jurídico em relações antes firmadas na “palavra”são, novamente, tratados internacionais, onde há a mistura de culturas diferentes em busca de um ideal comum sendo mais do que provado a importância de algo que regulamente negócios entre diferentes Estados, com diferentes sistemas jurídicos e formas de pensa-lo e aplica-lo.