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terça-feira, 28 de agosto de 2012

Direito restitutivo e repressivo em "A Laranja Mecânica"

“Am I like just some animal or dog? . . . Am I 
just to like some clockwork orange?”




Para Émile Durkeheim a solidariedade mecânica relaciona-se a um alto grau de consciência coletiva, predominante em sociedades menos complexas onde os indivíduos possuem pouca diferenciação social. Desta maneira a coesão é resultado da semelhança entre os sujeitos. O seu direito é repressivo, em que a preocupação primordial é a punição do sujeito infrator por meio da privação da liberdade, dor ou humilhação. Já nas sociedades mais complexas, na qual há uma grande diferenciação social e maior grau de individualismo, existiria a solidariedade orgânica. Neste caso, os indivíduos devem negar suas vontades com o intuito de contribuir com a coletividade. Nessas sociedades mais complexas o direito restitutivo predomina, ou seja, elas não compreendem um direito fundado unicamente na punição sem critérios, e a pena possui a intenção de recuperação e reinserção do individuo na sociedade.
Baseando-se em partes da teoria de Durkheim, o filme inglês Laranja Mecânica (Clockwork Ornage), de 1972, inspirado no livro de Anthony Burgess e dirigido por Stanley Kubrick, é um bom exemplo da prática do direito com caráter repressivo e restitutivo. A obra fictícia conta a historia de Alex (Malcom McDowell), líder de uma gangue de delinquentes que buscam o prazer por meio da violência e crueldade. Após assassinar uma mulher, Alex é traído por seus companheiros e capturado pela polícia. O caráter repressivo do direito pode ser observado no momento em que o protagonista é julgado e condenado a 14 anos de prisão, ou seja, a preocupação primordial não é reinserir Alex na sociedade, e sim puni-lo por seu delito. Entretanto, é oferecido à personagem a possibilidade de diminuir sua pena servindo de cobaia para um novo experimento do Estado: o Método Ludovico, que consistia em um tipo de lavagem cerebral, relacionando a violência à grandes desconfortos físicos e submetendo o infrator a filmes extremamente violentos (sem que o mesmo pudesse desviar o olhar, e ainda recebendo doses de medicamentos que lhe causariam náuseas). O método Ludovico pode ser enquadrado, de certa forma, no âmbito do direito restitutivo, uma vez que seu objetivo é reinserir o individuo na sociedade como um sujeito “normal”, mesmo que utilizando meios eticamente duvidosos.
É interessante perceber que a violência praticada por Alex é considerada doentia e inaceitável pela coletividade. Contudo,considera-se a violência que o Estado utiliza para a “cura” do personagem justificável e legítima, já que tinha o intuito de restituí-lo à sociedade. O novo Alex é como uma “laranja mecânica”, sem livre-arbítrio, incapaz de reagir à violência que o cerca, e, essa violência que antes gerava prazer, agora resulta em agonia. É abordando esses métodos correcionais que o filme assume destaque, possibilitando a reflexão acerca de quais meios seriam realmente adequados para se realizar a ressocialização dos indivíduos com atitudes socialmente inaceitáveis e ainda levantando a questão do controle que o Estado é capaz de exercer sobre a sociedade, adaptando-a aos seus interesses.

*Para quem ainda não viu o filme, segue o link com o trailer