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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Tudo flui


“Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”, é o que determina o art. 3° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga Lei de Introdução ao Código Civil). Entretanto, é de entendimento geral, mesmo por parte da doutrina, que o conhecimento da totalidade da legislação de um país é impossível para qualquer cidadão, sendo um juiz de Direito e especialmente sendo um cidadão juridicamente leigo.
Assim, exemplifica-se o entendimento de Durkheim sobre o papel do Direito Penal nas sociedades modernas, em contraposição àquele exercido por ele nas anteriores. A partir do advento da Modernidade, com a crescente complexização das relações sociais, o surgimento das mais diferentes funções e especialidades no campo profissional, o Direito também se torna mais complexo, deixando de fazer parte totalmente das consciências de todos e cada um dos cidadãos. A gama de crimes se tornou muito mais extensa, até porque junto com a multiplicação de tipos sociais, multiplicaram-se os direitos a ser defendidos. Desse modo, seria hipocrisia esperar que um cidadão comum, ainda que bem instruído, como ,por exemplo um professor de literatura conhecesse todos os 361 artigos do Código Penal e os 811 do Código de Processo Penal brasileiros.
Ou seja, como explica o autor, o Direito não está mais determinado por aquilo que a sociedade desaprova. Até porque, com a especialização do trabalho, os membros da sociedade se tornaram tão diversos que não existem mais atos aprovados ou reprovados pela totalidade do corpo social. Cada grupo reivindica diferentes direitos e ações específicas do poder público, e o que os índios defendem como justo não é o mesmo que os mineradores; o que os operários esperam não é o mesmo que os executivos; o que os ruralistas acreditam não é o mesmo que os partidários da reforma agrária, e assim por diante.
Até por isso Durkheim acrescenta que o que define a solidariedade (fator de coesão social) nas sociedades modernas não é mais a homogeneidade social, como o era anteriormente, mas sim a pluralidade, a variedade. Essa diferença não destrói a coesão social porque determina uma interdependência entre seus membros; cada grupo e cada função, enfim, cada órgão desse grande organismo social precisa dos demais para garantir um equilíbrio, de modo que é necessária uma cooperação para restabelecê-lo, quando este é abalado por meio da quebra de alguma norma.
Então, esse passa a ser o papel do Direito: não mais eliminar uma parte do corpo social que se mostra contra a consciência coletiva, mas restabelecer a ordem imposta pelas normas para tentar garantir o funcionamento saudável do organismo que representa a sociedade. Percebe-se, portanto, que não mais cabe a crença num direito natural, diante de tanta diversidade de crenças: o Direito é forjado pela máquina estatal, conforme surgem as necessidades e reivindicações de determinados grupos. E já não cabe mais a totalidade dos cidadãos combater e punir os delitos: cada um deve se limitar a sua função no mecanismo social, e é ao Estado, como organizador e executor do Direito, que cabe essa função. 

A pena de morte em sociedades complexas




De acordo com a teoria de Émile Durkheim, a solidariedade orgânica está presente naquelas sociedades mais complexas onde a divisão do trabalho se encontra mais presente. Como característica dessas sociedades, considera-se predominante o direito restitutivo, aquele que se preocupa na reinserção do individuo infrator à vida coletiva. Entretanto, podemos encontrar inúmeras características do direito repressivo em sociedades extremamente complexas e avançadas; entre elas: a pena de morte em alguns locais dos Estados Unidos, a maior potência econômica do mundo e com excelentes índices de qualidade de vida.
Nesse tipo de pena, considera-se que o infrator rompeu com as regras sociais tão gravemente que é inadaptável à vida coletiva. Sendo assim, a única solução, rápida e eficaz, seria tirar lhe a vida para evitar novos delitos. Desta forma, podemos perceber que mesmo em sociedades extremamente complexas, ainda há penas de caráter passional, que expressam o desejo de justiça, defesa e vingança da coletividade.
O documentário “Ao Abismo” (Into de Abyss), 2011, de Werner Herzog, é extremamente pertinente ao estudo da teoria de Durkheim. O filme relata o destino de dois jovens condenados pelo assassinato de três pessoas. Um deles é condenado à prisão perpétua, e o outro é condenado à morte.
 Longe de sensacionalismos, Herzorg desenvolve seu documentário de forma humana e imparcial, dando voz aos dois lados: são entrevistados tanto os dois infratores (um deles no corredor da morte, uma semana antes de receber sua pena), como os familiares das vítimas. Por meio de perguntas diretas ou disfarçadas, Werner Herzog é capaz de obter algumas respostas concretas, ou apenas o silêncio como símbolo de lamento dos envolvidos. São expressos sentimentos e opiniões de todos aqueles que, de alguma forma, estão insatisfeitos com o ocorrido e com suas consequências. Herzog dá grande enfoque à vida dos assassinos antes do crime, mostrando um histórico de desestruturação familiar, abandono, violência, e uso de drogas por aqueles que os rodeavam. Durante todo filme, Herzog tenta chamar nossa atenção para a necessidade de reestruturação de um sistema: com mais educação, oportunidades de empregos e valorização da instituição da família; e não a punição tão drástica.
Como lazer ou como estudo, o documentário é extremamente interessante para entender (ou ao menos tentar entender) as causas e as consequências para os envolvidos em um crime cujo resultado será apenas mais uma morte.

Bolacha tostines



A moderna forma de organização social, segundo o sociólogo, parece pressupor uma solidariedade orgânica como fator de coesão social. Tal solidariedade reforça laços de dependência entre indivíduos que, por meio da execução de tarefas cada vez mais específicas e ofícios específicos, dependem uns dos outros para a vida em sociedade. Não obstante, a possível ausência de uma consciência coletiva homogeneizadora, parece ser a eficiência do trabalho um valor compartilhado, uma vez que a complementariedade de funções garante certa coesão social. Assim, a eficiência do trabalho, ou falta desta, perece ser o valor presente e unificador capaz de nortear ações sociais. Em um sistema de solidariedade orgânica onde o trabalho é muito especializado, a ausência deste valor parece indicar, no mínimo, um retardo no funcionamento social ou ainda uma disfunção em sua engrenagem. Porém, a preocupação com a eficiência de um ofício especializado pode acentuar um processo de desinteresse pelo conhecimento de outros ofícios e assim maior especialização ou individualização, ou seria a acentuada individualidade moderna o fator responsável por uma maior especificação do trabalho? Talvez, mais importante que saber se a individualização social causa um aumento do trabalho especializado, ou se o trabalho especializado causa um aumento do processo de individualização social, seja conhecer as possíveis consequências sociais de tal processo e em que rumo caminhamos. 

Durkheim e a criminologia.
Antes de Durkheim, duas eram as escolas mais famosas no estudo do crime: A Escola Clássica de Cesare  Bonesana e a Escola Positivista de Lombroso . A primeira voltou seu olhar para a análise do crime e a segunda para o entendimento do criminoso.
A análise do delinquente feita, especialmente, por Lombroso  tendia para um determinismo biológico. Algumas características físicas e antropológicas eram tomadas como parâmetro de identificação do delinquente. Emile Durkheim surge com uma alternativa a essas teorias. Ao observar a importância do papel da sociedade para uma contribuição criminógena, o funcionalista em questão rompeu paradigmas e acrescentou muito na sociologia criminal com a Teoria da Anomia ( “ausência ou desintegração das normas sociais” ¹). Segundo essa teoria o delito deve ser visto como um fenômeno normal e importante no desenvolvimento e equilíbrio de uma sociedade, pois  o crime “pode ajudar a sociedade a consagrar sua própria identidade em torno de determinados valores.(...) ajudando a comunidade a refletir  sobre seus valores e crenças a serem superados.”
Um grande sucessor das ideias de Durkheim foi Robert Merton que disferiu sérias críticas a imposição social do American Dream que pregava que o individuo deveria ascender socialmente através do consumo, no entanto não dava chance de uma igualdade de acesso a esses produtos. Ou seja, investia em uma propaganda de metas mas não fornecia ferramentas e caminhos suficientes a todos.
Tanto Durkheim como Merton, deixaram de ver o crime como um fato isolado. Passaram a identifica-lo como fenômeno com função social. Além de propor um reflexão acerca de valores, ainda pode ser capitalizado pelo sistema econômico vigente, como é o caso das indústrias de segurança que  vendem  os mais variados artigos ditos seguros, ou as grandes construtoras que lucram com a venda de casas em condomínios protegidos com todo aparato imaginável e inimaginável.
Portanto, segundo palavras de Alessandro Baratta acerca da teoria da anomia, “ nos limites qualitativos e quantitativos da sua função psicossocial, o delito é não só um ‘fenômeno inevitável, embora repugnante, devido à irredutível maldade humana’, mas também ‘uma parte integrante de toda sociedade sã’”³

¹ SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia 2004, p. 215.
² SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia 2004, p. 229.
³ BARATTA, Alessandro. Criminologia critica e critica do direito penal: introdução à sociologia do direito penal/tradução Juarez Cirino dos Santos 2002, p. 60.

Jéssica Thais de Lima

O Direito enquanto expressão da Sociedade Moderna.


Portrait of the Lawyer Dr. Fritz Glaser
1921
Otto Dix
                Na Modernidade os indivíduos estão unidos não por conta de crenças comuns, mas pela individualidade de seus ofícios, seus trabalhos. A Solidariedade é o principio que garante a unidade entres os membros da sociedade, se dá pela complementariedade das funções. A presença de um elemento diferente não desagrega, mas fortalece a comunidade. O trabalho é um ponto fundamental.
                O Direito não é mais um sedimento presente nas consciências, está agora disposto à inovação, mudança e a substituição de um fundamento por outro. Sua flexibilidade liga-se com a tarefa de regular harmonicamente as funções do corpo social agora tão diverso. A Natureza especial de suas tarefas escapa à consciência coletiva: enquanto as funções têm alguma certa generalidade, toda gente pode ter delas alguma sensibilidade.
                A lei expressa agora técnica, não um estado emocional. Os círculos aos quais se aplica são reduzidos, por isso a normatividade não está presente nas consciências. A violação dessas normas não atingem suas partes vivas nem a alma comum da sociedade, por consequência não pode determinar reação que não muito moderada.
                As formas predominantes do Direito moderno tem conotação negativa para a solidariedade, o Direito Real é a solidariedade com as coisas, não contribui para a unidade do corpo social (as coisas gravitam em torno das vontades). O Direito Pessoal vincula um individuo a outro e não ao objeto em sí, apenas repara ou previne danos, não é uma relação de cooperação. Longe de unir, ele acaba por separar o que está unido pela força das coisas. A normatividade “não consiste em servir, mas em não prejudicar”.


Extremos. Ideologias? Falta de ideologias.
Pensamentos e vontade de mudança da realidade, do mundo. Não é dessa forma que se transforma o mundo... Não se começa lá de cima, querendo mudar toda uma estrutura social firmemente estabelecida.
Assim, não haverá nem mudança do alto e nem do baixo.
Não adiantou gritar, exaltar, sofrer por isso. Talvez a vontade fosse matar, arrancar, bater! Mas não adianta.
Não adianta, e realmente não adiantaria. O senhor, idoso, sai como indefeso. Como sofredor. Como uma pessoa ingênua e que não deveria ter sofrido essa falta de respeito.
Coitadinho... Já é velho! Nem deixaram falar! Que absurdo! Só poderiam ser alunos da UNESP, são arruaceiros e só destroem nossa cidade, não são civilizados.
Talvez eu retorne com a palavra: Não somos arruaceiros, somos cabeças pensantes (acho que sim), e que apenas se deixaram levar pelo momento de ira e revolta. Não destruímos a sua cidade, fazemos parte dela agora, talvez por 4, 5 anos. E contribuímos para o desenvolvimento dessa cidade. Nos tornaremos profissionais muito bem qualificados para trabalhar aqui. E é muita hipocrisia crer que 3000 pessoas, dentro de uma cidade com 300000 é força suficiente para destruir a cidade. Termino a fala com a seguinte afirmação: não se preocupem com a imagem da UNESP, mesmo se algo extraordinário ocorresse lá, não seriamos bem vistos por Franca.
Temos dois sentimentos: o de vitória e o de vergonha.
Nem um, nem outro! Não são vitoriosos! Não deveriam se sentir envergonhados!
Vitória? Pelo que? Pela palestra talvez ter mudado de lugar? Talvez pelo fato de terem se unido com força suficiente para ter expulsado... Entretanto isso não é vitória!
Vergonha? De que? Pelo fato de sermos mal vistos? Pelo fato de ter saído no jornal? Vergonha seria se o senhor, desse sua palestra, fosse aplaudido de pé e sem nenhum questionamento sobre suas ideologias e sobre o que prega, sobre seu discurso de ódio...
Democracia. Essa é uma palavra muito complexa para mim. Significa muita coisa. E ela foi usada em diversos contextos e em diversos argumentos contra ou a favor do ocorrido. A única pontuação que faço é não creio que punição de certas pessoas é um caminho democrático. “Cada ato tem sua consequência, agiram dessa forma então devem sofrer as consequências.”. Não há e nem tem porque escolher certas pessoas para serem punidas. Havia muita gente no protesto.
Sem extremos. Pense. Seja racional. Reflita ao invés de julgar.
Uma mesma multidão, embora com pensamentos diferentes, deseja mudanças concretas. 








Se analisarmos a história do Brasil, perceberemos que em boa parte desta houve um grupo minoritário, detentor do poder, que oprimia a maioria da população. Essa situação foi observada durante a monarquia, o período da República das Oligarquias, o governo varguista e, mais recentemente, o Regime Militar. Na verdade, tal situação, infelizmente, pode ser observada também nos dias atuais, mas com uma diferença: nos encontramos em uma democracia. Aliás, a atual constituição foi elaborada justamente no momento posterior a um período de muita repressão e, naquele momento, muitos desejavam direitos para toda a população, incluindo os grupos minoritários e sem tanta expressão social até então. Entre tais direitos está a liberdade de expressão.

Presenciamos na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da UNESP Franca uma violação de tal direito. Durante um evento que organizara uma palestra com Dom Bertrand de Orleans e Bragança, um grupo de manifestantes invadiu o anfiteatro gritando frases de apoio à reforma agrária e xingamentos como “nazista” e “assassino” ao chamado “príncipe”. Um dos argumentos dos manifestantes era o de que a universidade pública, enquanto espaço público e pertencente a um Estado democrático, não poderia tolerar a presença de alguém antidemocrático e que costuma fazer discursos de ódio – o que fere a constituição. No entanto, se a universidade é um espaço público pertencente a um Estado democrático não deveria garantir o direito da exposição das mais diversas ideologias e posicionamentos políticos? Além disso, considerando que muitos alunos presentes no local gostariam de ter assistido à palestra, não fora essa uma atitude também antidemocrática?

Claramente, a maioria dos alunos era contrária àquilo que Bertrand costuma defender em seus discursos, que em geral são bastante conservadores e agressivos. Mas, ainda assim, muitos queriam ter tido a oportunidade de assistir à palestra. Desse modo, cada um poderia a partir do que seria dito, formar a sua própria opinião acerca do tema, além de confrontar as ideias do palestrante através de um debate.

A organização do movimento estudantil foi válida, pois reuniu pessoas para a realização de um debate a respeito dos discursos de Bertrand e do convite que este recebera para realizar a palestra na UNESP (no momento anterior à palestra). Esse tipo de discussão é bastante importante no meio universitário e na sociedade como um todo. Contudo, da mesma forma que o movimento estudantil luta para que a universidade seja um ambiente para qualquer tipo de pessoa e para ter o direito de expor suas ideias sem que sejam reprimidos por isso, não deveria ter expulso um convidado da universidade sem ao menos dar a chance deste falar e daqueles que estavam presentes na palestra, escutarem. Uma atitude assim prejudica a imagem do próprio movimento estudantil frente a outros alunos e funcionários da universidade, além de dar oportunidade à mídia de destacar os pontos negativos das ações do mesmo, distanciando-o ainda mais do restante da população.

O ciclo da dependência



Émile Durkheim, em sua obra “A Solidariedade devida à divisão do trabalho ou orgânica”, mostra, como já citado em texto anterior, o conceito da chamada Solidariedade Orgânica, que, segundo ele, mais se aplica à sociedade moderna. Sendo a Solidariedade a responsável pela coesão social, na Solidariedade Orgânica, de forma mais específica, cada indivíduo contribui com o todo com a realização de sua própria função, o que nos torna dependentes uns dos outros. Como um conjunto de engrenagens. E essa mesma Solidariedade Orgânica permaneceu no tempo e alcançou a nossa sociedade pós-moderna.
Vários acontecimentos nesses últimos dias -não, não vou falar da presença do “Príncipe”- fizeram com que eu novamente me lembrasse de nossas aulas de Sociologia, e enxergasse na prática o que discutimos em teoria. Isso me mostrou não só que podemos adaptar a teoria durkheiminiana hoje em dia, mostrando o quão atual ela pode ser, como também o quanto tudo isso está tão próximo de nossa realidade cotidiana.
Nessa semana, meus pais venderam a casa em que vivemos os últimos dez anos na pacata cidade do interior. E agora, para onde iremos? Pois é, não sei. Depende. Depende, primeiramente, se meu pai ainda deseja permanecer na cidade de seu nascimento. Como a resposta é sim, depende se conseguirão contratar um trabalhador que construa uma nova casa. Sim, meus pais dependem de seu tempo e, principalmente de seu trabalho. Em troca, esse trabalhador receberá dinheiro. Suas contas dependerão desse pagamento. Dependência... É essa a palavra de ordem da Solidariedade Orgânica. É esse ciclo que, em nossas relações capitalistas, nos vem corroendo, por padronizar, fixar como sucesso algo que não precisa ser regra geral. Um vício, uma dependência. Meu futuro – brilhante?! – dependerá de meus estudos. Mas só será brilhante se eu alcançar, principalmente, grande êxito financeiro. - Será?!
Em cidade pequena, todo mundo conhece todo mundo. Então, meu pai foi pedir informações a um conhecido sobre algum pedreiro caprichoso e que tivesse disponível para realizar um serviço reparatório simples antes de entregar a casa ao comprador. E foi aí que mais uma vez notei o quanto nem sempre podemos nos autorrotular “modernos”, e que, por vezes, ainda voltamos à Solidariedade Mecânica. A resposta foi dada sem muitos pudores: “O único livre é aquele ex-presidiário”. O direito restitutivo, característica da Solidariedade Orgânica, em que, após o cumprimento da pena, o indivíduo deveria ser reinserido na sociedade, tinha ido pelos ares. Por quê?! Por causa de toda a nossa (ir)racionalidade.
Enfim, exemplos não faltarão àqueles que tentarem visualizar as ideias de Durkheim na prática. E sensação de ter realmente aproveitado a vida não faltará àquele que, mesmo não fugindo do fato de que dependemos do dinheiro, não colocar o sucesso financeiro como o único motivador de seus atos.


Utilidade social


Baseado no texto “A Solidariedade devida à divisão do trabalho ou orgânica”de Emile Durkheim somos capazes de discutir um grande conceito trazido pelo autor: a solidariedade.
            A solidariedade segundo o autor se daria pela complementaridade das funções sociais. Assim, na sociedade pré-revolução industrial, reinava a solidariedade mecânica já que todos possuíam praticamente a mesma função social, sem que houvesse grande diferenciação de trabalho. Posteriormente, com surgimento de inúmeras fábricas e tecnologia, houve uma grande diferenciação de tarefas, ou seja, cada ser humano possui deveres, uma utilidade social diferente, o que permite classificar essa “nova” sociedade em solidariedade orgânica.
            Interessante se faz notar o quanto a sociedade capitalista em que vivemos abraça a classificação das pessoas baseada em sua utilidade social.Um exemplo? Desde nova as crianças possuem a sua infância ameaçada por perguntas do gênero: “o que você vai ser quando crescer?” – em outras palavras é como se perguntassem: “atualmente, você não é nada, mas como você pretende ser útil economicamente a sociedade?”. Essa ideia de conseguir alguma utilidade social é um dos maiores pesadelos, ops, digo, preocupações do ser humano.
Olhando por outro enfoque, percebemos que a solidariedade pode ser orgânica, mas a sociedade, por sua vez, é robotizada, mecanizada, a inteligência, então, nem se fala. Aqueles que possuem o privilégio de serem educados em alguma escola, universidade, são instruídos em uma educação que busca “formar” e não “libertar”. Não há o desenvolvimento de uma inteligência criativa, aquela responsável por nossa salvação, existência, aquela que conseguiu dar solução aos problemas de um corpo não especificado, proporcionando que criássemos roupas, casas, carros, armas, geladeira, fogão...   enfim, tudo que instrumentalizasse um corpo tão frágil como o nosso.
            Questiono-me até onde conseguiremos e admitiremos viver em uma sociedade com solidariedade orgânica. Não, não estou sugerindo que voltemos ao Paleolítico ou Neolítico, mas até a onde a função social de alguém pode sobrepor o que há de mais belo em um ser humano que é simplesmente a sua humanidade. O mundo está muito individualista, sombrio, aquele que “senta ao seu lado na sala de aula, pode ser o seu concorrente, tirará o seu emprego, a sua função social, a sua utilidade social, a sua tarefa econômica...”. Que desperdício de tempo.  Quantas oportunidades perdidas de engradencer a vida, não é Benjamin Disraeli? Afinal "a vida é muito curta para ser pequena.”

A sociedade orgânica segundo Durkheim

Em sua obra, Da divisão do trabalho social, Émile Durkheim caracteriza duas sociedades distintas, a mecânica e a orgânica. Para ele, inicialmente unidos por seus vínculos culturais comuns numa sociedade regida pela solidariedade mecânica, os indivíduos passam a se organizar em torno de relações de produção e dependência, propiciadas pelo desenvolvimento da técnica e crescente necessidade de especialização para atender à demandas cada vez mais diversificadas.

Essa sociedade orgânica, embora menos ideologicamente ativa do que sua predecessora, é tanto mais capaz de manter-se coesa, adotando não são os valores à ela intrínsecos, mas também a interdependência material, sujeitada a essas valores, para irrelevar o indivíduo perante o todo.

Não obstante, a própria noção de coerção é, para Durkheim, inerente às sociedades orgânicas, pois o conjunto de valores morais sobrejacentes, a superestrutura social, só pode adquirir coercitividade com o afloramento da consciência individual, diretamente vinculada a diferenciação social.

Yuri Rios Casseb

Crescer e se adaptar


Ao nos mostrar como as sociedades pré-modernas chegaram a modernidade e também suas mudanças comportamentais nesta mesma “fase”, Durkheim inclui o direito, como ciência, como ferramenta fundamental para o funcionamento da sociedade orgânica e também como característica principal desta mesma, ciência do direito, que se diferencia de suas características pós-modernas, por exemplo, ao proporcionar à sociedade mecanismos para a solução de conflitos modernos que muitas vezes não possuem resolução se vistos pelos olhos de ferramentas legislativas já existentes.
                As novas formas de se lidar com situações jurídicas também fogem das características da pré-modernidade, onde a ciência do direito era vista como o direito penal somente e as inúmeras áreas do direito, que hoje, particularmente, tornam esta ciência tão atrativa, eram “deixadas de lado” e conseqüentemente também eram “deixadas de lado” as inúmeras relações sociais proporcionadas por estas áreas, restringindo o direito como ciência. Se nesta sociedade moderna, que é pautada principalmente por relações de trabalho, existisse simplesmente um direito penalista, como seriam tratados assuntos trabalhistas ou comerciais, por exemplo?
                Se uma nova relação social surge e se esta mesma alcança patamares de importância não imaginados pelo sistema antigo, é função do direito como ciência se expandir e alcançar o mesmo patamar. Se diferentes sociedades seguem diferentes caminhos em seu desenvolvimento, é necessário que o direito se desenvolva junto, corrigindo as imperfeições geradas, garantindo a ordem social e resolvendo novos problemas, tão complexos quanto possam ser, provando que é realmente uma Ciência.

Valorização das diferenças


A sociedade moderna é caracterizada pela sua alta complexidade, que proporciona uma pluralidade de ofícios e de consciências. Assim, a consciência coletiva já não é de grande valia, sendo que a alta diferença social, e a especialização e pluralidade se destacam nesse meio.
Durkheim então afirma que os homens não estão ligados por terem uma consciência com crenças e pensamentos comum, mas sim pela individualidade dos seus ofícios, que quando somados passam a se completar.
Quando se conceitua solidariedade orgânica, percebe-se que esta é a negação de si, para o trabalho social. Porém nesta sociedade o que é diferente é um acréscimo, e não algo a ser rejeitado, ao contrario do que ocorre com as sociedades pré-modernas.
Assim a pluralidade é uma forma de gerar novos conhecimentos, e essa inovação faz com que o Direito seja algo mutável.
Nessas sociedades, há a predominância do Direito restitutivo, que tem como função regular harmonicamente a sociedade. Portanto, por exemplo, a especialização da divisão do trabalho, exige novas normas.
Quando este é especializado, foge da consciência coletiva, assim os lugares aos quais se aplica são reduzidos, e por isso a normatividade não está inserida nas consciências.
Este Direito não deve ser regido pelo emocional, mas sim pela técnica, portanto as normas não devem consistir em servir, mas sim em não prejudicar.

A modernidade nos levando à coesão banal


Estudando o tempo moderno em que vivemos, podemos verificar que na sociedade moderna a coesão não mais está mais baseada em algum ideal comum nos conscientes coletivos que as une, mas sim por necessitarmos de outro ser para o perfeito funcionamento do organismo social. Essa teoria da ”solidariedade orgânica” que Durkheim analisa em sua obra nos mostra como a sociedade evoluiu da pré-modernidade para a modernidade, e nos esclarece como a sociedade atual convive e se mantém unida.
Em seus estudos, Durkheim nos mostra que com a evolução da sociedade, o modo como esta se mantém unida modificou, pois antigamente nas sociedades pré-modernas existia certa homogeneidade em relação a preceitos, e que somente pela união da sociedade que haveria êxito na esterilização do ser estranho que está prejudicando o perfeito funcionamento social.
Com o advento da modernidade, os elementos da sociedade passaram a ser mais individualistas, principalmente graças à divisão do trabalho que Revolução Industrial trouxe, e assim, não há a união que existia anteriormente, e o corpo social necessita de outro meio para se manter unida. Ademais, com a modernidade e a divisão do trabalho as funções de cada um tornaram-se mais especificas, e essa especificação deixou as pessoas mais dependentes umas das outras, pois agora o trabalho é realizado por alguém especializado apenas em um tipo de função, diferentemente de antigamente que o profissional valorizado era aquele que tinha um conhecimento amplo em vários setores, embora conhecimento este superficial. Esta dependência que os membros da sociedade possuem uns com os outros que na modernidade é que faz com que o corpo social mantenha-se unido.
Analisando o texto de Durkheim, vemos como os motivos de união da sociedade alteraram-se no decorrer dos tempos, e que com a modernidade os homens tornaram-se muito mais individualistas e dependentes uns dos outros, fazendo com que os ideais não sejam o principal motivo para unir a sociedade, e sim uma simples necessidade individual de sobrevivência.